Desenho



Não vemos.

Descobrimos quando tentamos desenhar.

Não ouvimos.

Descobrimos quando tentamos entender.


Um rosto, o rosto amado.

Eu, que vendia retratos, 

não consigo desenhá-lo.

Reproduzo apenas, e muito bem, sua pupila. 

Não lembro sequer a cor de seus olhos.

Seu nariz se encaixava em meu rosto quando preparava o beijo.

Pondero e reflito sobre seu formato.

O do beijo.

O queixo se aninhava em minha mão.

Redondo, convexo.

As maçãs, se escuras ou pálidas, não sei mais dizer.

Os cabelos, esfumei, mas recordo a textura.

Esfrego meus dedos uns nos outros para tentar reproduzi-la melhor.

Não consigo desenhar seu cheiro.

Só ele ficou tridimensional,

concreto 

em mim.